Mens sana in corpore sano.
Soundtrack: Chico e Lucinha - História de uma Gata
Tenho um gato vira-lata.
Eu estava realmente planejando ter um gato, mas um de raça, peludo, de pedigree assepticamente puro - só que esse bendito gatinho vira-lata atrapalhou meus planos quando cruzou o meu caminho feito a pedra do Drummond. Feio. Microscopicamente feio, com uma crosta antiga de sujeira sobre a pelagem branca, sujeira velha mesmo para um animal com menos de duas semanas de vida. Manco. Olhudo. Levei-o comigo enrolado numa camisa e dei casa, comida, roupa lavada, CPF, RG, uma vida dentro das CNTP e amor desbalanceado, pendendo sempre para a ultrapassagem do limite superior da normalidade (mas reza a lenda que amor que é amor é sempre plus ultra). Em troca, ele usurpou a minha família, meu iogurte desnatado e o meu coração. E o último item, o tal que para ser o que é deve ser plus ultra, ele retribuiu, como retribui até hoje, igualmente sem medida, e o até então pretendido gato de pedigree asséptico virou poeira cósmica sapecada em algum lugar da minha memória de peixe.
Pois bem: há um tempo, coisa de um mês, minha irmã caçula me telefonou preocupada e meio chorosa para contar que o gato estava doente e que veterinário algum descobrira o mal de que o bichano padecia. Não comia. Não miava. Não brincava (sim, meu gatinho brinca e pasmem, abana o rabo, convencido talvez de que, equivocadamente ou nem tanto, existe um gene canino no seu DNA). Não "nada". Mas o que mais impressionava era a febre: um febrão digno de uma legião de microvilões estafilocócicos destruidores de gatinhos, no mínimo uma nada inofensiva sepse. S-E-P-S-E. Meu gatinho vira-lata, o tal que com duas semanas de vida sobrevivera no mundo em condições inóspitas e se salvara graças a seu charme e inteligência, estava prestes a ser derrotado por uma bacteriazinha chinfrim. Corre que corre com ele de veterinário em veterinário, vão-se amostras de sangue, vêm hemogramas e... surpreendentemente nada, nadinha, nem um leucócito a mais, nem a menos. O veterinário, então, bateu o martelo: febre emocional. A prescrição: atenção, em altas doses, seguida à risca, e em menos de 48 horas o animalzinho estava serelepemente curado.
E se alguém estiver se perguntando "e o que é que eu tenho a ver com isso?" eu respondo: nada. Mas quem é que que nunca teve uma febre emocional na vida, uma febrícula que fosse? Quem é que nunca se deixou atingir pelo tal virusinho ou bacteriazinha que deixa a gente com aquela terrível sensação de sei-lá-o-quê? Não existe influenza que seja páreo para a melancolia, porque tristeza não é imunomodulada - a gente não produz anticorpos contra ela, mas é cientificamente comprovado que a severa inflamação espiritual decorrente desses estados sorumbáticos é perfeita e eficazmente combatida com outro tipo de manifestação flogística: o calor humano. É uma delícia ser lembrado e receber um carinho apenas porque batatinha-quando-nasce-se-esparrama-pelo-chão. É bom, é inexplicavelmente bom ouvir um inesperado "te gosto", ou "que saudade de você", ou aquele mutismo de olhos derramados com cara de cafuné, ou sentir o toque daquela mãozinha - ou mãozona - pousando na pele ou nos cabelos apenas porque deu vontade. É inexplicavelmente bom mas não apenas inexplicavelmente bom: é necessário. Porque cada um de nós é, no fundo, aquele fulano que passa distraído e sem querer querendo se deixa cativar pelas surpresas do caminho. E cada um de nós, no fundo, é exatamente como um gatinho vira-lata, com nódoas no pedigree, cruzando o caminho de alguém para carinhosamente lhe atrapalhar os planos, olhudo, manco e faminto, esperando para ser enrolado numa camisa e num coração. Plus ultra.
Você já abriu seu coração hoje?
P.S.: pessoas, esse é meu Theo.
P.S. 2: vocês se lembram o que são as tais CNTP, não lembram? ;)
40 comentários:
Tristeza não tem fim Flávia, felicidade sim, ainda mais nas Condições NTP...
Só tu mesmo para me fazeres lembrar de tantas cisas que não fazemos diariamente.
Beijo
Tristeza não tem fim Flávia, felicidade sim, ainda mais nas Condições NTP...
Só tu mesmo para me fazeres lembrar de tantas cisas que não fazemos diariamente.
Beijo
Oi Flavitha, quem dizer que nunca teve uma febre emocional, está mentindo...rsrsr Bjs e saudades do seus comentário no meu mais novo blog. Bjocas e felicidades para ti. Cris
É verdade... tristeza, angústia, melancolia e outros sentimentos ruins acabam refletindo no físico. Mas que bom que ele está melhor!
Ele estava longe de vc?
Eu não sei o que são as CNTP.
Bjs
Eu abro o meu... Escancarado...
Diariamente.
Cruel é quando a recíproca não é verdadeira.
Mesmo assim continuo entregue. Prefiro assim.
Beijuca
Aaaahhh como o Teo é fofo!
E sim! Quem nunca teve uma febre emocional???
Flavia, queria te perguntar uma coisinha... Como fez esse layout? Acho ele tão lindão =)
Beijo grande...
Sarava!
Tenho um gata idosa.
E ainda não abri o meu coração hoje...
;)
beijoca
Esses bichinhos tiram a gente do sério, mesmo!
Quanto a febre emocional, eu já tive algumas, ela é real!
Beijocas
que gatinho lindo! Espero q esteja melhor...
NTP?
E há quem ainda diga que os animais não têm sentimeentos, que são movidos única e exclusivamente por instintos! Bah... mais humanos que nós humanos, muitas das vezes.
Bjm Flavinha
Ai meu deus...que lindo o Theo!!!
Quem não quer viver dentro das CNTP? Todos nós temos muito do seu gatinho vira-lata, Théo! E nem imaginávamos que tínhamos! Beijão, Flavinha!
Sim, somos mesmo todos gatos vira-latas esperando carinho. Somos mesmo um bando de carentes. Ainda bem, eu acho. Se fôssemos todos independentes, acho que a humanindade não ia pra frente não. Ninguém ia precisar de carinho, então íamos ser todos um bando de corações endurecidos. Aff.
Adorei o texto, muito bom!
Seu gato é lindo.
E eu ,embro o que é CNTP, apesar de que já fazia um bom tempo que não escutava isso...
bejos!
Apesar de tudo, esse gato é muito sortudo por ter você.
Beijos!
Eu tive um cachorro vira-lata que aconteceu isso. Nós o pegamos em época de férias, portanto, todos dávamos atenção. Quando começaram as aulas ele ficou doente e minha mãe teve que brincar com ele! Justo ela, que dizia não gostar de cachorro!:))
Bom, o seu espelho pequeno tem a péssima mania de ficar sem ar... Eita trabalheira esses moleques carentes! :))
beijinhos, menina
Entendi perfeitamente o seu post, Flavinha! Criei gatos durante anos, vi vários nascendo e peguei outros na rua, exatamente como você fez.
Não gosto de quem não gosta de gatos.
E, sim, eles nos entendem completamente!
Bjooooooooossssssss!!!!!!!!
Olá!
Que estória mais comovente!!!
E que lindo seu gatinho...
Sim, eu já tive febre e acho que foi mesmo emocional...
Beijos.
Querida, adorei sua história.
Seus textos são ótimos como sempre.
Amo gatos e o seu é lindo.
Quem nunca teve febre emocional?
Pois é...
Bjos moça =**
Perco voz, cai cabelo, cheia de manchas, caio acamada. Sou uma heroína traídora de literatura do século XXVIII. Totalmente a flor da pele.
beijas
Aaah que liiindo..o bichano mais parecia gente, cheio de febres emocionais..que fofo,caraa!
E que bunitinho...
saudadd daqui,
beijo.
flores.
queee lindo o gatinho, nada de feio.
bom, no primeiro de janeiro deste ano, minha mãe e minha vó passeavam contemplando mais um ano que abria-se pela pracinha perto de casa, e lá dentro de uma caixa debaixo de um dos chalezinhos encontrava-se 2 gatinhos, um branquinho e outro pretinho, mirradinhos, de miado fraco.
e hoje estão lá com seus 5 meses de vida, Frido e Café, lindos fofos, e amados!!!!!!!!!
Sempre tenho febre emocional,sempre.
Beijos flavinha, sabe que amo te ler!!!!
Todo gato tem essa cara de preguiça, né? :D
A gatinha Tudi teve algo muito parecido com isso... o veterinário queria mandar ela para MG fazer exames. Sair da PB para MG era algo que Tudi adoraria... Ela iria ficar vidrada na comida mineira :)
todos os dias sinto sintomas de saudade. vontade do calor humano dele. a distância dói. a falta só traz mais falta. depois vem um preciso te ver. os braços entrelaçados...enfim
beijos bonita!!!
Ah... Que saudade de você, desse lugar que me acolhe como um ninho que os pássaros voaram, voaram e, num súbito desespero, voltaram e voltaram... Ah, querida, é sempre bom voltar de um lapso e ler coisas aconchegantes, linhas que prendem, chamego que desvenda uma verdadeira razão de viver: o amor.
Beijos, querida.
todos que um dia amamos já tivemos...e ainda teremos muitas febres...
ps. tenho medo de gatos
garota, invadi, não resisti mesmo. me identifiquei com a sua história e achei linda. tb tenho gatinhos de rua que eram feiosos e meio tortos quando chegaram por aqui e viraram minha vida. hj, são parte de mim e é lindo ver q isso acontece direto por aí. é isso.
beijinhos ;**
Estou precisando ouvir um inesperado "te gosto" ou "que saudade de você". Dias de carência...
Ele é lindo!
Quando uma das minhas cadelas morreu, a outra ficou bem triste, a saúde até piorou. Mas hoje está tudo bem.
(E eu tbm sei oq ue é isso).
;)
Passei para dizer duas coisas:
- Adote-me, too.
Coloquei uma coisa lá no vento... olha lá.
Você se recorda daquelas febres minhas, não é?! Toda vez que a tua mãozinha-mãozona atravessava os limites cibernéticos no meu pensamento, a febre ia embora. Até que não voltou mais. Recorda?
Então,
agora eu ando com a temperatura numa leve alteração. Mas em julho eu rosolvo isso!
;)
Beijos, amiga-metade.
Eu não gosto de animais, mas não me atire pedras, calma! rs.
Apesar disso, Theo´s já apareceram em meu caminho, de outras formas. Com essas mesmas caracterísitcas, trazendo um pouco de afago pro peito em sede de cuidado.
Beijo, Flavinha.
Saudades de você!
Que texto tri! Bah, não tenho gato. Mas aqui no telhado de casa, nasceu um com listras pretas e olhos verdes. Pequenino. Que nesse frio dorme na área aqui de casa. **risos**
bjos, querida!!!
oooown meu deus, que coisa linda! tenho uma paixão absurda por gatos e cachorros que, infelizmente, não é partilhada pela minha mãe que, mais infelizmente ainda, é quem manda.
é muito engraçado ver que o ser humano se acha tão superior mas tem as mesmas doenças que os OUTROS animais.
MUITO lindo seu gatinho.
:*
p.s.: eu prefiro os vira-latas!
Amo Chico Buarque ;-))
E, sim, já abri meu coração hoje. Não gosto quando ele fica fechado, dá agonia, falta de ar (não das boas, e sim, daquelas bem ruins...)
Queria ter um gato, só tenho um cachorro, e nem gosto dele tanto assim. Ah, quero um coelho também, e um hamster... ah, quero tudo.
Beijo.
Minha querida Flávia, que linda história. Mas é exatamentente assim que as coisas andam dentro desse ser aqui. Moribundo, febril, doido por um afago, um braço me apertando as costas. Eu ando abrindo meu coração sim minha querida, mas o poeta ada cansado de tê-lo aberto de mais e nada entrar... risos
Grande abraço perfumado
Meu coração anda tão, mas tão cansado...não consigo revirar as latas de lixo pra que uma dona qualquer me encontre.
O que um gato faz essas horas? Afinal, todos eles são solipsistas. Serei o único que não consigo aturar isso?
Excelente texto, Flavinha. O desfecho do parágrafo sobre abrir o coração foi top. E como sempre, tuas analogias são campeãs.
Beijocas!
POde ter sido saudade, moça... Saudade de tu!
E sabe que eu também tenho um assim? Fui levar Meg (minha yorkshire) pra tomar banho, quando Darlan (o rapaz que dá o banho) me mostrou um gatinho lindo e com menos de uma semana de vida. Tinha sido deixado na rua. Fiquei tão apaixonada que convenci minha mãe e o trouxe pra casa. Dei até de mamar, na mamadeira, ás três horas da madrugada... Hoje Darlanzinho (o gato que tem o nome em homenagem ao "padrinho") é a coisa mais linda do mundo!!!!!!!!
Desculpa, é que me empolgo falando dele...
Beijão pra tu
Como eu sempre acreditei, carinho e amor curam todo e qualquer mal.
Seus textos são uma delícia, Flávia! Pena que só conheci qdo vc resolveu tirar umas férias... :(
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