"- Você poderia me dizer, por favor, que caminho devo seguir para sair daqui?
- Isso depende bastante de onde você quer chegar (...).
- Eu não me importo muito com isso (...).
- Oh, então pouco importa que caminho você irá tomar."
(L. Carrol em Alice no País das Maravilhas)
Problemas. Sempre eles.
Atire o primeiro livro de contos de fadas quem nunca
desejou ter uma varinha de condão capaz de solucionar qualquer transtorno com
dois ou três plim, plim. Ou quem
nunca se sentiu virando a abóbora mais murcha da paróquia muito antes da
meia-noite. A vida não é fácil. Mas se a sua for mesmo um conto de fadas, aí
sim, você está definitivamente em maus lençóis.
A heroína que sofre durante toda a história para ter direito a ser feliz no fim, ou aquela que passa a vida inteira encastelada aguardando que um príncipe encantado a resgate da maldição que a impede de viver além dos muros do quarto mais alto da torre, costuma não enxergar as coisas como elas realmente são. Sorte que qualquer miopia existencial pode ser perfeitamente corrigida com as maravilhosas lentes do bom senso, as quais nos permitem não somente enxergar a realidade como também auxiliam a modificá-la de maneira que ela passe de masmorra a céu aberto – pois liberdade, mais do que se atirar de cabeça no que a gente quer, é não se deixar acorrentar por aquilo que a gente pode até querer, mas não nos serve.
A vida se torna especialmente difícil justamente quando
se está feliz: sempre aparece alguém oferecendo uma maçã envenenada. A parte
boa é que a gente sempre pode recusá-la. Ou, na pior das hipóteses – quando a
mordemos por descuido, por ingenuidade ou por birra, mesmo – ainda dispomos da
prerrogativa de vasculhar nossos confins interiores em busca de um antídoto ao
invés de simplesmente adormecer para o que se interpõe no caminho a fim de nos
fazer mal. Descalçar os sapatinhos de cristal, arregaçar as mangas e ir à luta.
Trocar o choramingo de acreditar que a vida é a madrasta malvada que nos obriga
a perder o melhor da festa pela consciência de que cada um de nós é sua própria
fada-madrinha: somos o que nos permitimos ser e, sobretudo, o que trabalhamos
para nos tornar. Abrir os olhos para a trilha de migalhas de pão que a intuição
deixa em certos trechos do caminho, a não ser que a ideia seja mesmo virar
comida de lobo.
E, porque verdades não são relativas – verdades são
verdades, relativo é o que fazemos com elas – não custa lembrar: sapos não
viram príncipes, e príncipes, além do potencial de se transformarem em sapos,
não são garantia de felicidade. Será mesmo vantagem passar a vida esperando por
um ser encantado que só aparece no fim da história, depois que você, sozinha,
matou dragões, salvou a vovozinha, se livrou do caçador, deu uma lição na bruxa
má – tudo isso, sem dúvida, perdendo um pouco da elegância e muito da paciência
em inúmeras situações, mas igualmente sem dúvida, dando conta do recado magna cum laude? A gente anda tão dependente de relacionamentos que muitas vezes confunde
se apaixonar com querer se apaixonar - por um medo irracional da solidão ou do
preconceito subliminar que determina ser socialmente inaceitável estar só e ser
feliz assim. Amor só rima com dor enquanto a gente permite. E nos
empenhamos tanto em procurar a pessoa certa, e queremos tanto reconhecê-la em
meio aos demais, que nos esquecemos de nos tornar a pessoa certa para nós mesmos.
Moral da história: cada pessoa é autora de seu próprio
roteiro, e ninguém precisa esperar até a última página para ser feliz. O País
das Maravilhas é um estado de espírito permanentemente em construção, e a melhor
varinha de condão se chama “mãos à obra”. Ser capaz de enfrentar a vida como
ela é, com todos os seus problemas, reveses e imprevisibilidades, sem perder o
brilho nos olhos também é um jeito, quem sabe o mais lúcido, de ser feliz para
sempre.
Imagem: Google |
7 comentários:
Este texto exprime a minha visão e postura de vida.
Me amando para que alguém me ame, como eu sou. Não tem outra fórmula.
Espero que sejamos felizes sempre, não, somente, no final da história.
MARÍLIA,
É costume ouvir das nossas mães, quando somos pequenininhas: "você é uma princesa". Crescidas é que descobrimos que ser princesa parece bom, mas melhor mesmo é descobrir quem a gente é - e viver quem a gente é. Beijo!
Tudo isso é verdade, e muito bem colocada, mas se a gente dá sorte e encontra a cara-metade, aí o prazer é du-tri-quadri-plicado. Ainda creio que há alguém perfeito para cada um de nós, porém, às vezes, shit happens...
Com um fundo musical "Ainda bem" by Marisa Monte.
RIDICULOUS THOUGHTS,
eu sempre me pergunto qual será o seu nome :)
Os problemas nunca acabam,isso que acaba com a gente.
Os problemas nunca acabam,isso que acaba com a gente.
CAMILA,
Acaba não. A gente tá aqui pra resistir :)
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