Seria um dia como todos os outros, mas foi meu dia de arrumar a casa.
Pó e teias de aranha subjugavam todos os meus cantos. Tralhas inúteis acumuladas a perder de vista, engolindo as portas com voracidade, a obstruir implacáveis minhas já débeis ousadias de enxergar que sim, que havia mundo além de mim... um colorido indefinível e carcomido era o triste estado das minhas paredes; ocupando por inteiro a solidão dos meus cômodos, o ar pesado, quente e sufocante que há tanto tempo alimentava meus pulmões.
Mas era meu dia de arrumar a casa. E meu peito se encheu de uma compaixão arrependida, ao ver que ainda havia beleza jazendo sob os destroços do que um dia fora segurança e aconchego. E eu, outrora tão alheia e negligente, não mais conseguia sequer cogitar a idéia de abandoná-la, e percebi, em meio àquela desordem completa e descabida, que era chegado o momento de enfrentar o caos.
Penosa me foi a tarefa de recolher cacos e bugigangas, amontoados que estavam por todos os lados. Esvaziei os armários não sem dificuldade; me desfiz de meu velho e pesado baú de memórias, repleto de mágoas, insensatezes, rancores, frustrações – alguns tão antigos que nem me recordava ainda estarem ali. Feri-me, é verdade, fiz calos nas mãos; contudo, a despeito do corpo alquebrado, sorvi a certeza de me saber mais leve.
Vasculhei todos os cantos em busca de pó e teias de aranha, e vi os raios de sol entrarem tímidos, porém festivos e resolutos, através das frestas diminutas que se revelavam diante da claridade tão desejada e enfim presente. E restaurei minhas paredes rotas, gastas, e as vi ressurgirem vibrantes, imponentes, refletidas com todos os tons que se irradiavam de minhas cores nascentes. E, em um arroubo, abri todas as portas e janelas, e respirei profundamente a pureza do ar que havia banido de mim, e que agora me invadia com a benevolência lépida e impetuosa de uma correnteza.
Arranquei sem piedade as ervas daninhas que se haviam multiplicado junto aos meus muros. E até esses fiz virem abaixo – pois para coisa alguma jamais serviram tais muros, afinal. Replantei meu jardim em um pedaço de terra que, de tão esquecido, virara terreno baldio – mas que, embora ignorado, recebeu minhas sementes e as germinou com amor de ventre materno. E me aninhei naquela terra, e a senti cálida e amorosa, e vi como era bonito o nascer dos girassóis... e chorei todas as lágrimas felizes e serenas que havia guardado sem saber para quê, e vi essas gotas de mim serem chuva fecunda para o novo universo que despontava diante dos meus olhos.
E embebida de um cansaço feliz repousei placidamente o corpo sobre aquele chão tão deliciosamente meu, e me deixei ficar a apreciar minha obra, e me permiti ser parte de tudo o que havia brotado da labuta de minha alma. Pois fora meu dia de arrumar a casa. E, enfim, era doce e reconfortante me sentir habitável.
56 comentários:
muito lindo seu texto amiga!
sabe fiquei longo tempo faxinando profundamente e ainda estou, o blog faz parte disso ...
e o texto me lembrou uma música que surgiu na minah vida bem no início desse processo e que adoro.
vander lee- meu jardim. conhece?
bjs
segue a letra que tem tudo a ver.
Meu Jardim
Vander Lee
Composição: Vander Lee
Tô relendo minha lida, minha alma, meus amores
Tô revendo minha vida, minha luta, meus valores
Refazendo minhas forças, minhas fontes, meus favores
Tô regando minhas folhas, minhas faces, minhas flores
Tô limpando minha casa, minha cama, meu quartinho
Tô soprando minha brasa, minha brisa, meu anjinho
Tô bebendo minhas culpas, meu veneno, meu vinho
Escrevendo minhas cartas, meu começo, meu caminho
Estou podando meu jardim
Estou cuidando bem de mim
FOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOODÁÁÁÁÁÁÁÁÁSTICA!!!!!!!!!
Pra variar.
Como sempre.
HUMPF!
Impressionante, você.
PUTA-QUE-LAS-TRAPA-PORRA!
Só sai palavrão de mim, porque só sai perfeição de você.
TE AMO assim. PERFEITA!
Beijucas
Genial, como sempre!! Essa "faxina" faz-se extremamente necessária para transformar as nossas vidas... mudar é sempre uma forma de rebeldia, mas é algo que faz-nos enxergar um mundo mais bonito, sem as ervas daninhas que muitas vezes destroem aquilo que temos de melhor: nossos sonhos!!
Parabéns Flavinha, vc é demais!
os mornos ventos da mudança sopram.
lagal eu texto, srta.
Menina, você tornou uma faxina coisa agradável de se fazer - a própria descoberta de si mesma e da possibilidade e o encanto de um novo jardim.
Beijinhos!
Mirian Martin
www.caldeirao-da-bruxa.myblog.com.br
Aaaai Bigadinha Flavitchaa pelo SELINHO!
E o memê vou logo-logo responder!
=]
Acho que o blog é o maior centro de faxinação que existe!
e o bom é que qdo a gente vê a fachina dos outros..Inspira a nossa!!!
=] Beijuu gataaaa
Que delicia de texto Flávia. Nossa fiquei extasiado com a delicadeza e leveza dele. Parabéns e obrigado por fazer da minha manhã tão doce.
Bjos
pó e teias de aranha. lá no alto, longe que nem com uma vassoura daquelas de cabo bem longo dá para alcançar.
distância, distância. porque tinha que ser tão longe, né?
Por Zeus!
Mulher que lindo.
Fodástico!!!
Oi,linda
Belíssimo!
É difícil ,dói,cansa,mas revigora!!
Que seu novo universo venha repleto de flores!
Beijos
Lindo texto. Eu achei que já tinha feito a tal faxina em mim, mas nesses dias de mal humor ando tendo dúvidas.
Beijos
E obrigada pelo presente!
;-)
Nuuuossa!
Esse texto a gente deve ler praticar sempre, né não?! MARAVILHOSO, FODÁSTICO E PERFEITAAAÇO, como estão dizendo meus alunos aqui... Sim, pq neste exato momento em que escrevo, estou no laboratório de informática com os meus pequenos, e navegando pela blogosfera, no seu cantinho especialmente! :)
Você tá pronta. Minha autora preferida: meu amor e beijo pra você sempre, limpos!
Adorei este lugar. Me comprazi com cada letra. Nunca uma faxina me fez sentir tanta poesia. Adorei.
bjos
Mulher, dizem por ai... "quero escrever como ela quando crescer.." Mas e se a gente já cresceu? rsrsr
Muito bom. A poesia está mesmo nos lugares mais inusitados, numa calçada, na sujeira... Nada como uma faxinazinha bem escrita (!) pra alegrar nossa alma. Bjs Lindona!
Flavinha.
A desordem do nosso espaço físico é o reflexo da nossa confusão mental
Um cansaço interno que só termina... quando organizamos todos os pápéis... gavetas.
Lavamos todas as louças.
Varremos e passamos o pano.
A mente fica limpa também.
Pronta para a próxima bagunça... rs.
Abração procê.
"estou podando meu jardim,
estou cuidando bem de mim..."
Lindo demais!
preciso de uma faxina também.assim que eu conseguir driblar a inércia. a mesma que tem me deixado sem escrever...
aah, o meme aí debaixo, listinha feliz! acho que você daria uma boa roteirista, de verdade!
no mais, nos esbarramos pela flip, ou pela europa mermo...
xêro. enorme.
a tal faxina interior... smp tão importante
texto lindo
bJos
Bem, sendo uma arrumada de casa metafórica, ok.
Mas literalmente falando, não, obrigada. Hahaha
Beijo!!
Ps.: O presente tá lá no meu blog pra você.
uma frase resume tudo é penoso limpar as coisas e descartar as velharias.
o que é se sentir habitável?
BeijA
sério? me deu preguiça...hehe
arrumação só quando não tem jeito...
beijos daqui...
Fiz uma dessas arrumações a poucos dias... Me senti mais leva... É reconfortante...
Cansa muito, dói, e traz lembranças... Mas é bom! E vale a pena fazer de vez em quando...
Beijão
Bonito muito bonito , fato é que ao ler o texto e os comentários confirmo o que me diz um amigo do peito:
"se vc não está confuso , está mal informado" e seguimos limpando as lentes do óculos e as teias dos cantos.
Abraços
Tadeu
A TODOS,
Muito obrigada pela visita e pelo carinho de sempre... perdoem esse bilhetão coletivo - culpa da dor de cabeça que não me deixa pensar direito hoje. Beijo pra todo mundo, e obrigada por cada palavrinha!
Oi minha doce amiga Flavia.
muito sujestivo esse texto.
Boa semana , com muita paz e amor em seu coração.
beijos da amiga.
Regina Coeli.
Te aguardo no cantinho da deusaodoya.
Tanto em nós precisa ser descartato para dar lugar a algo melhor. Pena não ser um simples faxina que remova as tranqueiras do nosso espírito.
Belo texto! Beijos!
Mais um post seu que eu lembro do outro blogue e que achei o máximo!
Legal isso de re-publicar as coisas. Assim, parece que vem com uma roupagem nova e mais brilhante ainda! (;
Beijinhos, flor.
REGINA,
Ô, querida... uma semana iluminada pra vc também, cheia de paz, amor e coisas boas... obrigada pelas palavras sempre tão doces, tô passando no seu cantinho. Beijos!
LEILA,
A gente não pode é ficar acumulando tralha... já pensou o trabalhão na hora de tentar limpar? Beijo!
PAULA,
Eu adoro quando vc lembra, rs. Beijos!
Nunca vi uma faxina tão bem feita quanto essa, teoricamente falando. Foi faxina na alma também, guria?
Ô, Flavinha, que lindoooo. Perfeito como vc e sua alma linda, minha mana querida! E joga mesmo toda tralha fora, pq é preciso espaço pra guardar as coisas maravilhosas e perfeitas que estão logo ali, na sua frente no caminho...
Amo-te, fofo demais esse!
A faxina não limpa somente o ambiente, não é mesmo??! Faz também com que o nosso humor fique mais "clean"!
Adorei teu espaço...escreve muito bem!
Beijos Doces,
Pitanga
Meu quarto é desorganizadamente arrumado, mas ali eu me acho bem... rs
Falando sério agora, este é um assunto recorrente para mim: faxina, coisas velhas no quarto etc. Por isso, gostei muito das suas palavras.
Beijos
Flávia,
Você não sabe o quanto esse teu texto absurdamente tocou meu coração.
Preciso "faxinar-me" o mais rápido possível para me sentir mais leve.
Pó e teias tem que ficar pelo caminho mesmo.
Maravilha, querida, maravilhaaaaaaa!!!!
Beijos e uma ótima semana!
Obrigada por sua visita em meu blog! Voltarei mais vezes!
Beijos
ELENITA,
Na verdade foi na alma mesmo. O quarto, amiga, não queira saber, pelamordedeus nao queira saber, haha. Beijo!
PITANGA,
No fim das contas o esforço acaba valendo a pena, tudo reluzindo, feito novo... bem vinda sempre! Beijo!
DAN,
Eu sou mestra em guardar coisas. No quarto e na alma. Quando resolvo jogar tudo fora, me livro de tudo que está sem uso... beijo!
PATTY,
Mãos à obra, flor! Obrigada pelo carinho. Beijo!
DAMA DE CINZAS,
opa, de nada! Beijo!
ando com meu aspirador de pó pendurado nas costas como aquela coisa dos Caças Fantasmas... mas olho pra tras e sempre vejo q ainda ficaram umas tracinhas escondidas...elas são espertas mas ainda acabdo com elas!
valeu pela visita
bjsss
To precisando desesperadamente de uma faxina, desse jeitinho que você descreveu ai.
:*
SAUDAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAADES...
aiai...
cof-cof-cof
:)
love you. beijU.
OOOOOh Flavinhaa..
tu ta melhor da cabeça?
problemas é? espero que não!
Beiju qlr coisa estamos a ordem!
Esse tipo de limpeza deixa a alma leve,leve.
Faz um bem enorme.
Beijo
SI,
eu é que agradeço por vc ter vindo, moça. Beijo!
CIÇA, BABI,
Pervertendo o que disse Pessoa: "faxinar é preciso"... beijos!
PATI,
Amigãããã... love you tanto, tanto! Beijo!
.A NEGRA.,
Menina, "melhor da cabeça" eu um tô não, senão não seria eu, né? Rs... mas a dor tá cedendo sim... obrigada por perguntar! Beijo!
Oi Flávia,
me lembrei de uma frase do Nietzsche enquanto lia seu texto: "É preciso ter um caos dentro de si para dar a luz à uma estrela brilhante". A faxina veio a por em ordem seu caos e nasceu essa ternura toda dentro da sua alma. Admiro a beleza das suas palavras e gosto da forma como elas me envolvem.
Um beijo.
Obrigada pela visita Flávia. Fantástico seu texto.
Big Beijos
Guria,
parece-me que li esse texto uma vez num outro blog(???). A autora é Flávia Britto. hehe Guria, desculpe-me se confude=i, mas me parece que li ele uma vez já. Mas adorei ler ele. As mudanças, as coisas novas da vida, o ambiente que nos rodeia quando ganha nova forma, nos traz a vida novamente.
Desamarra a gente das cordas que fazem o mesmo círculo. Que são dos mesmos comprimentos. Nos tornamos diferentes.
Ps:Muito obrigado pela visitinha no meu blog. Aquele conto ficou foda. Nem acredito que o escrevi. hehe
Beijos e abraços!!!
Com carinho!!!
Marcos Seiter
Flávia, o caminho das pedras passa por aqui, tudo é do jeito melhor do que se espera.
Por sinal do jeito que gosto.
beijo
ta ai ... jogar bola com a careca deles UHSUSHSUH, uma coisa q eu ainda ñ tinha pensando rs
bJos Flá (q intimidade)
Que texto maravilhoso..!!
é... parece q hoje é meu dia de faxina tbm. Preciso levantar e dá uma boa arrumada na minha vida, pois ela estava em fase de construção... e vc sabe né?!! Construção suja tanto.. então tenho que levantar, sacudir a poeira e começar a limpar tudo por aqui!!
Belo texto!!
Vlw a visita!!
Abraços...
Susanna Martins
FILIPE,
Eu nunca sei o que te responder. É sempre tanta delicadeza, tanta gentileza... que eu só posso te agradecer, de coração. Beijo!
LULU,
Valeu, querida. E de nada! Beijo!
MARCOS,
Siiiiim, esse texto já tinha sido postado lá no falecido Cotidianidades, fico feliz que lembre dele! E o conto ficou literalmente f*, mesmo, hehe. Beijo!
ANGELO,
Ah, obrigada! Seja bem vindo por aqui, moço. Tô passando pra conhecer vc. Beijo!
A VIDA COMO ELA É,
Hauhuahuahua... é o único jeito de fazer aquelas cabecinhas peladas terem alguma utilidade, cê não acha? Beijo!
SUSANNA,
Ah, sei sim. A minha não anda muito diferente. A sujeira acaba sendo inevitável. Sorte pra vc aí na sua obra! Obrigada por ter vindo, gostei muito de te receber. Beijo!
Linda, coisa boa é arrumar...né?
Encontrar o melhor jeito de organizar tudo....
Isso me da um prazer enorme...
Se bem que na verdade eu quase nunca guardo velharia, sou alergica a pó. rsrsr E como eu fico de bico toda vez que quebro minha unha limpando sujeira...prefiro nao acumular...
rsrsrsr
Um beijo enorme no teu coraçao!!!
Que disposição, mas quando acaba vem aquela alegria pelo serviço feito! Há algo no meu blog que vai agradá-la. Postei 2 coisas num post só. Vá lá, preciso dos seus comentários.
wwwrenatacordeiro.blogspot.com/
não há ponto depois de www
Um beijo,
RENATA MARIA PARREIRA CORDEIRO
RS: GOSTO DO SEU BLOG. QUANDO ESTIVER CANSADA, VIREI AQUI PARA RELAXAR!
Querida, UFA!!!
Ah, q tri, fico tão feliz com isso.
Adoro lê-la!!!
ESTOU TÃO FELIZ COM ISSSSSSOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!
JÁ VAI FAZER UM ANO QUE NOS CONHECEMOS AQUI NO BLOGSPOT!!! EBAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!
bEIJOS QUERIDA!!!
Com carinho!!!
Marcos Seiter
Nunca imaginei uma descrição do arrumar a casa...
E esta está linda, perfeita, maravilhosa, poética, Flávia Brito!
beijo!!!!!Gisele
Tiveste o seu dia do Muro de Berlim. Todos precisamos disso pelo menos uma vez na vida.
Um beijo!
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