segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Da Pequena e Dolorosa Impropriedade de Não Sangrar Até Viver

"Then share thy pain, allow that sad relief;
Ah, more than share it! give me all thy grief."

(Então compartilha a tua dor, permita que se alivie a tristeza;
Ah, mais que compartilhá-la! dá-me todos os pesares.)

Alexander Pope - Eloisa to Abelard

Soundtrack: Russian Red - Gone, Play On





Hoje, estranhamente, eu quereria sofrer.

Quereria uma dor que me cortasse a carne. Dilacerante. Súbita. Agônica. Feita de infinitas dores menores, aquelas todas que teimei um dia em não sentir ou em não vivê-las com a entrega que mereciam de mim. Uma dor implacável, uma dor agigantada pelo meu próprio medo de sentir dor.

Hoje eu quereria uma dor de coração em frangalhos e choro devastado, de mãos e pernas trêmulas e espasmos de corpo inteiro e joelhos feridos da queda – sem lenços, sem consolações, sem ofertas de ombros ou amparo, sem, sem, sem. Pelo chão, um a um, crises existenciais, mecanismo de luta e fuga, papéis em branco e rabiscos imaginários. Uma dor egoísta: inteira minha. Uma dor que me possuísse com a fúria das dores rejeitadas e menosprezadas que vêm para cobrar seu tributo quando a fragilidade nos assola e não me atreveria novamente a escorraçá-la, venha, eu te acolho nos meus braços suados; apenas me esgote e me anestesie até que eu nada sinta e, então, se despeça com um beijo torto e saciado e vá embora exatamente como veio. De uma vez.