sábado, 30 de janeiro de 2010

Todas as Canções São de Amor

Para você, todo amor que houver nessa vida.

Soundtrack: Frejat - Amor Pra Recomeçar





Eu ainda não conheço você. Não sei se os seus olhos são castanhos como uma tarde repousada sobre a noite que ainda caminha sobre as horas, ou de algum outro tom entre a tranqüilidade e a inquietação. Não conheço ainda a sensação do toque as sua pele, eu que desejo tanto tocá-la. Não conheço ainda a sua risada; não conheço seus tiques, suas manias, a textura do seu cabelo cuja cor também desconheço.

Não sei se você gostará de Português ou Matemática. Não sei se preferirá azul ou amarelo; cachorros ou gatos; maçãs ou peras; brigadeiros brancos ou pretos; leite gelado ou morno. Se gostará de livros. Não sei o que quererá ser na festa de aniversário; não sei o que quererá ser quando crescer. Se terá medo de escuro e pedirá para deixar acesa a luz do armário na hora de dormir; se escreverá cartinhas ao Papai Noel ou se terá uma verve mais moderninha e esperará sem grandes superstições pela primeira bicicleta.

O que eu sei é que já há tanta coisa que gostaria de dizer, e sei também que todas essas coisas virarão apenas um silêncio bobo e emocionado quando eu olhar para você pela primeira vez. O que eu sei é que eu estarei ao seu lado na sua primeira cólica, na sua primeira gripe, na sua primeira febre, no seu primeiro passo, no seu primeiro tombo, na sua primeira palavra, no seu primeiro dente, no seu primeiro dia de aula, no seu primeiro amor, na sua primeira desilusão, e em quaisquer outra situações – porque eu ainda não conheço você mas já carrego você dentro de mim, e dentro de mim, além de você, carrego um amor que é o maior do mundo e que já é todo seu, eu que ainda não conheço a sua voz mas sei que ela será, para mim, todos os dias, a música mais doce, porque, com você, todas as canções são de amor.


O texto mais especial da minha vida para alguém
que existe há apenas 5 semanas e 1 dia, mas que já
é a pessoa mais especial da minha vida: meu filho.




domingo, 10 de janeiro de 2010

Porta-Retratos

"Que te dizer? Que te amo, que te
esperarei um dia numa rodoviária,
num aeroporto, que te acredito, que
consegues mexer dentro-dentro de mim?"


(Caio Fernando Abreu)

Soundtrack: Maxi Priest - Fields of Gold





Lembro de quando decidimos reinventar essa coisa toda de destino e, sem resistência, encantados com a idéia de domar o incerto, redesenhamos o imprevisível a lápis numa cartolina branca imaginária. Foi o desenho mais bonito que fizemos juntos, porque o fizemos de lábios colados naquela noite onde o que não era sonho era cumplicidade – e apenas a paixão adormecendo satisfeita entre as minhas pernas e os seus quadris quase tirava nosso sossego, num murmúrio de não necessidade de palavra, você e eu formados por um pedaço de cada atordoamento de amor errado que amamos nessa vida e, no entanto, tudo tão perfeitamente certo. Eu, enfiando o rosto no seu peito, encontrando ali a segurança do instante único em que o mundo para inteiro a fim de caber na palma da nossa mão; você, de olhos fechados e com o polegar me acariciando com suavidade uma unha – não o dedo, a unha, tão engraçado achei aquilo, e tão bom. Era a sua forma de declarar presença dentro da vida que eu ainda nem sabia que, dali em diante, seria a minha, e que nascia em silêncio enquanto eu observava o quanto o seu rosto ficava bonito daquela maneira, rasgando a penumbra como um facho de claridade de longos cílios. Lembro de como foi surpreendente nada mais ter importância. Foi a primeira vez em que não me desagradou não pensar e que acreditei que podíamos, sim, gozar esse mistério que é a felicidade absoluta, eu nem sabia se o que senti enquanto abracei o seu corpo morno e nu era mesmo felicidade mas era quase uma invulnerabilidade o que eu sentia; então acho que naquele instante eu completamente fui feliz, sim. Morno e nu, seu corpo. Escudo. Altar. Eu soube, ali. E nem precisaria muito mais para que aquele instante se perpetuasse, mas, confesso, guardei – num canto da minha memória que é o mais belo e enfeitado com o melhor que jamais houve mim – a tal cartolina imaginária e o desenho rabiscado, justamente o mais bonito, feito a quatro mãos, a lápis, a salvo do tempo, dos esmorecimentos e das desatenções.

É esse o quadro que beijo com carinho todas as noites antes de dormir.

Para L.


segunda-feira, 4 de janeiro de 2010