terça-feira, 25 de junho de 2013

Ordem e Progresso.


Quando eu era criança, minhas irmãs e eu nos indignávamos com minha mãe porque ela se recusava a cantar o Hino Nacional. O ápice da rebeldia acontecia durante as Copas do Mundo - quando ela, além de não pronunciar "ouviram do Ipiranga as margens plácidas", se recusava a vestir a camisa da seleção brasileira e a torcer pela vitória do Brasil durante os campeonatos; sua torcida invariavelmente pertencia a outras seleções e as escolhas que fazia nos pareciam absurdas, mas ela ficava ali, firme, assistindo aos jogos conosco e vibrando a cada gol do adversário independente dos protestos do restante da família. Dizíamos: você é antinacionalista, mãe. Você não ama o Brasil. Ela respondia: eu não me orgulho de muita coisa que aconteceu e acontece nesse país. Não posso vestir a camisa de algo que não me causa orgulho.


O tempo passou, mãe. E ano que vem, finalmente, teremos uma Copa do Mundo neste chão que foi nosso berço, que é a nossa casa. E vou lhe dizer uma coisa: eu também não me orgulho de muita coisa que acontece nesse país. Eu cresci, e agora entendo bem o que você queria dizer. Agora sei que não era rebeldia - era amor, porque só quem ama muito a sua própria terra tem coragem de usar a própria voz para dizer que temos direito a ser cidadãos que se ufanam de sua pátria a qualquer tempo, e não só a cada quatro anos. Eu também não vou vestir a camisa, mãe. E não me interessa se vão me chamar de antinacionalista ou de qualquer outra coisa, pois você me ensinou que a gente só é forte enquanto não desiste de lutar, ainda que a forma de lutar seja apenas não deixar esmorecer o espírito crítico mesmo diante dos apelos da emoção - e da multidão.

Eu não vou vestir a camisa, mãe. Você tinha razão. Você sempre teve.


4 comentários:

Anônimo disse...

Gostaria de registrar que já adoto essa prática há algumas Copas. Gosto muito de torcer - pasmem - pela Argentina, já que o seu azul e branco lembram demais o azul e branco do meu glorioso Paysandu.

Ass: Geraldo Pinho.

Unknown disse...

Aprecio bastante o seu blog e os seus posts. Sempre que posso tenho visitado o mesmo e delicio-me com o que escreve. Até coloquei na barra de favoritos :)

Espero que continue com o bom trabalho.

Cumprimentos

Margarida Fonseca Dias

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Alexandre Lucio Fernandes disse...

É essencial que não nos separarmos do que realmente queremos. Há um amor importante inflado em atos aparentemente questionáveis. Porque muitos não entendem o significado de sua renúncia. Não vestir, tem na sua essência um significado que transcende, porque é de "peito pra fora" que realmente podemos ser voz.

Nem isso significa que todos que vestem não sabem separar a importância de cada elemento no país, ou não sabem "gritar do peito pra fora". Nem todos se vendem por uma ilusória euforia. Uns torcem para ambos, o Brasil e o Brasil. Triste são os que se apegam apenas a brasões e estrelas e gols.
Comemoração e luta superficial, essas sim não nos servem.

Beijo!

Gera Careka disse...

Também já decidi que na próxima Copa irei torcer para a ARGENTINA!!! Parabens, você aprendeu direitinho de sua "Mama"!!!
Adorei seu texto...abs