domingo, 27 de outubro de 2013

do lado de dentro.

Imagem: Bailey Elizabeth (in deviant art)

Há algo sempre comigo. 

Nestes dias, principalmente. A vida segue quase comum - tudo igual, exceto essa coisa que está sempre comigo e que, agora, mal se restringe a me fazer companhia. Não sei dizer seu nome. Não sei dizer o que me provoca - comoção, angústia, tristeza, raiva, euforia, orgasmo. Uma iminência, um pressentimento, talvez. Seja lá do que for. Roo as unhas enquanto tento delimitar um espaço entre mim e esta coisa. Inútil; nem ela e nem eu nos habituaríamos a outras presenças, ou a presença nenhuma, nos momentos em que é preciso levar as mãos ao peito e comprimir com firmeza para que o coração não salte e se choque com a palavra paralisada entre os dentes. Esta coisa é quem limpa minha sujeira quando os sentimentos me evisceram. Esta coisa é que segura minha mão quando medos íntimos me violentam no meio da noite. Há tanto tempo me falta jeito para dizer amor ou delicadeza, mal me lembro se um dia foi fácil e deslizou através dos meus lábios como se tivessem carne de cetim. Roo as unhas, mordo as pontas dos dedos, arranco um pedaço do que faz meus olhos verterem casulos e perscrutações. Não há nenhum ruído lá fora, quase ouço o que se passa dentro de mim - mas esta coisa, esta que permanece comigo consistente e vígil como um cão de guarda, obscurece o silêncio cada vez que, de olhos fechados, me observo e insisto em me cobrar: quem é você?

Roo as unhas, meus dedos sangram um pouco. A dor me salva de (me) saber.




2 comentários:

Maria Midlej disse...

Muito bom aqui.

''Inútil; nem ela e nem eu nos habituaríamos a outras presenças, ou a presença nenhuma, nos momentos em que é preciso levar as mãos ao peito e comprimir com firmeza para que o coração não salte e se choque com a palavra paralisada entre os dentes.''

senti.

Alexandre Lucio Fernandes disse...

Ela precisa permanecer lá dentro. Lá é o seu habitat. É inerente dessa sensação, residir no espaço íntimo de nós. Não pode ser nomeado, e nem deveria se pudesse, porque ele carrega consigo segredos. Ele é uma engrenagem que faz o corpo funcionar e reagir. Ele que nos incita. Não nos cabe identificá-lo, mas é importante saber que é ele que nos torna inteiramente humanos. Sempre há algo dentro. E é importante que tenha. Em meio a sensações de apertos, uma hora, vem a libertação, o alívio. A alma, residindo nesse receptáculo limitado sempre oscila, como gangorra que luta para equilibrar os extremos.

Belo texto Flá!

Beijo!