sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A Saga do Peixe Frito

**Texto publicado originalmente no Espasmos de Riso Descontrolado, blog de humor escrito em parceria com as "comparsas" Anne e Mila, trazido hoje para cá com algumas pequenas modificações. Anne e Mila, saudades!**


Alguém aí conhece outro alguém traumatizado com peixe frito?

Caso sua resposta seja negativa, muito prazer, Flávia. A origem do drama vem de longa data: no auge dos meus singelos nove anos, quase fui brutalmente assassinada por uma posta (eu disse Posta) de peixe frito. Era domingo e a família estava toda reunida em um restaurante lotadérrimo. E eu era uma garotinha fresca: sempre tive aversão a tocar a comida com os dedos, o que significa que até mesmo o peixe era cuidadosamente destrinchado com garfo e faca (uma prévia das minhas habilidades com o bisturi). As reuniões da minha família nunca foram exatamente um mar de tranqüilidade: silogisticamente, levando em consideração que cada um de nós, Amaral que se preze, vale por seis, e de que à época éramos uma grande população completamente obstinada em congregar todos os ramos vivos da nossa vasta árvore genealógica em quaisquer eventos familiares – fossem estes almoços, batizados, formaturas, aniversários ou hospitalizações por diarréia – é fácil compreender porque, em todas as ocasiões, havia sempre uma situação propícia para a instalação do caos. Foi em meio à barulheira de vozes e talheres que senti aquele troço, que mais parecia um vergalhão de aço, estacionar na minha garganta. Esbugalhei os olhos e, com as mãos agarradas ao pescoço, tentei me fazer entender em meio à confusão.

- Gá... gá... gáááá... aa...

- Fala, minha filha. O que foi? – e mamãe continuava distraída com a história de não-sei-quem-fazendo-não-sei-quê-não-sei-onde que meu tio animado, contava entre uma e outra garfada generosa de moqueca com arroz.

- Gáááááááá...

- O que foi, meu amor? Quer mais um golinho de refrigerante, quer?

- Gáááááááá...

Eu gesticulava feito uma louca com as mãos ora agarradas no pescoço, ora abanando-se furiosamente no ar, o corpo sacolejando espasmodicamente na cadeira, o rosto vermelho de desespero e raiva por estar morrendo daquela forma tão idiota – assassinada por uma espinha de peixe. A essa altura os “gááááááá” haviam já se transformado em um misto de indignação e luta pela sobrevivência. Eu tinha nove anos e estava prestes a esticar as canelas pagando o mico do ano no meio de um restaurante abarrotado de gente. Ridículo. Mais ainda do que morrer atropelada pela enferrujadíssima Caloi Barra Forte ano 75 do padeiro Moacir (meu conceito maior de morte vexatória e dolorosa até aquele momento). Não sei quanto tempo levei naquela mímica bizarra – o fato é que mamãe percebeu que não era firula e que, definitivamente, aquilo não era vontade de tomar refrigerante: ela olhou para mim e o instinto de preservação da espécie foi incontrolável, assim como o grito que irrompeu assustador da sua goela maternal.

- Socooooooooooooorro! Minha filha está morrendo! Acudaaaaaaaam!

A hecatombe que se seguiu foi o equivalente microcósmico do apocalipse (o que quer que isso signifique). Apareceu gente de todos os lados, incluindo família, garçons, gerentes e curiosos mórbidos doidos pra acompanhar a novela mexicana da “menina que estava morrendo engasgada, tadinha”. As soluções para me resgatar da morte iminente eram mais apavorantes do que a possibilidade de passar desta para melhor.

- Dá farinha para ela, minha filha – e vovó dizia isso despejando uma chuva de farinha de mandioca dentro da minha boca pateticamente aberta.

- Faz ela comer banana.

- Tragam mais água. Tem que beber água gute-gute!

E foi uma avalanche interminável de água gute-gute, farinha de mandioca, banana e “gááááááá”... Davam-me tapinhas nas costas na tentativa de me desentalar. O barulho era tanto que não duvido que tenha inclusive corrido um bolão por ali (porque em todas as situações existe mesmo a torcida do contra). Felizmente havia por perto alguém sensato o suficiente que se lembrou de chamar os paramédicos, que me enfiaram um troço na garganta e retiraram a espinha-vergalhão-pseudo-assassina.

O gerente, com medo de que o incidente manchasse a reputação do restaurante, deixou nosso almoço fatídico por conta da casa. Passei uns longos dias com a goela dolorida, e uns longos anos sem conseguir me aproximar de peixe frito, farinha de mandioca e banana; continuo destrinchando ainda mais meticulosamente a comida com os talheres. A lição? Nunca, jamais, subestime o significado oculto de um “gáááááá”!


10 comentários:

Gustavo Martins disse...

com o rapaz aqui aconteceu igualzinho, só que as 4

não como peixe até hoje

a espinha desceu na base do miolo de pão, a garganta toda raspada e total trauma em relação ao sabor "fruto do mar"

Naiara Moura☼ disse...

eu adooro peixe frito; e já me acostumei a tirar/ignorar as espinhas ^^

o problema é todo aquele óleo,enfim ..

beijones!

Cris Medeiros disse...

Eu já passei por algo semelhante! E horrível!

Beijocas

Anônimo disse...

Delicamente emocionante o fato relatado. Mas, isso é frescura aguda. (vc e o belO) kkkkkkkk *brincadeira.

Nunca me aconteceu mas, me sensibilizo com histórias assim... deve ter sido uma dor horrível e as consequências então.

Flavinha amada, vms comer peixe frito na praia de Boa Viagem/Recife?! *brincadeirinhaaa

HEHEHEHHE

Adoro a sensibilidade que tens com as palavras.

Bjos ú&e ;D
PS.: .tua fã!

Anna Bueno disse...

Fravinhaaaaaaaaa rsrs
Já passei por isso com osso de galinha. Seria cômico se não fosse trágico, precisei ir pra emergência do Hospital de uma cidade praiana e me submeter a uma endoscopia. Foi péssimo..rsrs
Bjos!

Anna Bueno disse...

Fravinhaaaaaaaaa rsrs
Já passei por isso com osso de galinha. Seria cômico se não fosse trágico, precisei ir pra emergência do Hospital de uma cidade praiana e me submeter a uma endoscopia. Foi péssimo..rsrs
Bjos!

Anna Bueno disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
D.J. Dicks disse...

esse homem aqui é so saudades dessa mulher ai....

Annanda Galvão disse...

hahahahhahahaahhhahhahah
muito bom!

vinicius disse...

eu não gosto de peixe.. bléeee
mas casquei o bico com sua história rsrs