quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Absinto

"Talvez haja apenas um pecado capital: a impaciência.
Devido à impaciência, fomos expulsos do Paraíso;
devido à impaciência, não podemos voltar."

(F. Kafka)

Soundtrack: Beck - Chemtrails



Quero aquela dose de impaciência há tanto tempo relegada em nome de uma pretensa e discutível sobriedade. Pura, sem gelo. Amarga. Concentrada e envelhecida. Ácida, de uma acidez áspera e transgressora, dessas que inundam a garganta abruptamente sem lhe dar chance de recusa. Dessas que subvertem as boas maneiras e enxovalham as mesuras nascidas no ambiente duvidoso de uma serenidade já desbotada. Aquela dose, pura e sem gelo, aquela dose cujo sabor é o da minha boca hostil à constrangedora vulgaridade das palavras cuidadosamente pensadas. Então sente-se aí, e brinde, e beba comigo e não me estranhe a súbita vontade – que hoje também o dia nasceu estranho e é provável que sempre tenha sido assim e que sua verdade me tenha sido negada por estes olhos completamente bons, livres do filtro venenoso da fúria, e quem saberá dizer se estes olhos ainda são os mesmos que vermelhos e ligeiramente turvos me obscurecem o rosto. Sente-se, e beba. E veja, não é realmente estranho perceber que as coisas sempre foram como jamais ousaram ter sido?

E veja, não é realmente estranho? Esta abdicação súbita das incorrupções há pouco fervorosamente praticadas. Esta senescência das ingenuidades, estas nodosas incoerções, esta devastadora incongruência entre o real e o crido. Olhos completamente bons agora vermelhos e ligeiramente turvos por uma indiferença furtiva, que a indiferença usualmente se oculta sob a máscara das paixões pródigas. E compreenda, não é descrença ou embrutecimento ou sequer desesperança, é apenas e paradoxalmente um pouco mais de complacência para com as minhas imperfeições, e as suas, e as de tantos, então sente-se e brinde e beba comigo esta dose pura e sem gelo de impaciência tão necessária, num último ato de contrição.

42 comentários:

Filipe Garcia disse...

Oi Flavinha,

gostei do texto, do convite a uma dose de impaciência. Realmente, a falta da paciência, não deixa desbotar as cores. É nosso jeito de demonstrar aflição, inquietação com as coisas que não são do nosso jeito; trata-se dessa mania de perfeição que temos dentro de nós.

No entanto, pela primeira vez, o tom do seu texto não me impactou (estranho!). Achei as palavras pesadas, o vocabulário rebuscado e, assim, as idéias se perderam um pouco. É que eu gosto da leveza dos seus textos que sempre me acalentam. Mas não desgostei, não.

Beijo.

Flávia disse...

Ah, moço... deve ser porque eu ando mesmo desacalentada :)

Aliás, pensando por esse lado, é até bom que esse texto não tenha te impactado. Melhor absorver o impacto de posts mais alegrinhos, né? Beijos :)

Tyr Quentalë disse...

Adoro esse tipo de texto, Flávia.
Eles se tornam densos, dando êxtase ao passar dos olhos. Melhores saboreados ao buscar as entrelinhas.
Degustado em um suspirar mais delongado, onde os olhos mantém-se fechados, apenas para advinhar cada ingrediente contido nele.

Mafê Probst disse...

Ao contrário de você, não suporto mais essas minhas doses de impaciência. Com gelo, sem gelo. Com limão ou sem limão.
Esse excesso dela, anda me matando.

Afaste-se. É um veneno que mata aos poucos.

Inside Me disse...

oh flávia, assim vc mata os pobres dos leitores que anda num estão aptos a pescar as coisas nas entrelinhas, haja palavra chic, meu Deus! hahaha a impaciência, a indiferença nos deixa loucos em dados moomentos viu, mas faz parte da nossa vida!
amore, obrigada pela presença lá, pelos elogios, ai meu Deus (red) meu orkut tem umas trocentas fotos, tirei umas de biquini (roubaram, recortarem a cabeça e fizeram um fake ¬¬') bem feito pra aprender a num por foto assim lá =p, haha, bjs moça, se cuida!

Leo Lazzini disse...

valeu a visita flavinha!!!

bjo

Vivian disse...

...todo impaciente perde a oportunidade de ver o florir dos jardins nas faces do horizonte de amor...mas de qwr forma, entendi seu momento, e pelos seu outros textos, te vejo leve como brumas de poesia...muahhhhhhh

Anônimo disse...

Só nos resta brindar, com ou sem paciência, com ou sem complacência, com ou sem passionalidade...

Beijo

Cláudia I, Vetter disse...

Nossa Flávia,
teu punhal atingiu meu coração.

(pro)Fundo.

Ricardo Soares disse...

BELO TEXTO, BELO BLOG, INTERESSANTE SUAS DÚVIDAS PROFISSIONAIS E PESSOAIS... QUERER SER DE JOGADORA DE FUTEBOL A BAILARINA CLÁSSICA !!! QUANTA DIVERSIDADE ! gostar de café, chocolate, coca zero e bichos (muitos) e gente ( nem tanta) nos coloca no escaninho de pessoas com gostos iguais!!! adorei sua visita... volte sempre... bjs e não perca tempo lendo como eu "sala vip" ... hehehe

Rosa Canela disse...

Flávia ...adorei o texto ..adorei o blog ...minha primeira visita e já sou fã ...

Apropósito ...quero uma dose desta impaciência ...

Beijos

Rosa

Flávia disse...

TYR QUËNTALE,

E as minhas entrelinhas estão abarrotadas de detalhes, querida... beijos!

MARIA FERNANDA, VIVIAN, CLAUDINHA,

Gente, não me levem tão a sério... esse texto, apesar do tom pesado e destoante dos outros e da minha momentânea falta de paciência para algumas coisas (isso é real MESMO) é, parafraseando a minha querida P., um simples "exercício lírico". Se alguém ficar down por causa dele vou me sentir a Bruxa Malvada do Oeste ;)
Vivian, muito bem vinda, querida.
Beijos!

INSIDE ME,

Mas como é que vc me põe fotos de biquíni no orkut, nêga??? Aiai... beijos outros!

LÉO,

Idem, querido. Beijo!

PAULO R. DIESEL,

Tim-tim ;)
Beijos!

RICARDO SOARES,

Hahaha, nem pensar! Bom saber que estamos no mesmo "escaninho". E voltarei com certeza, te espero por aqui também. Beijos!

ROSA CANELA,

Ah, que linda! Seja bem vinda, moça-cor-de-de-canela! Será sempre um prazer te receber aqui. Beijos!

Bruno Cazonatti disse...

Olá, querida.

Sensacional, este post...
É tanta correria, viagem e falta de tempo, que às vezes não consigo comentar. Mas, espero que você compreenda, pois sempre estou lendo e saboreando este espaço.
Se o dia tivesse 30 horas, ainda me faltaria tempo...
Ah, que coincidência... eu tenho viajado demais para produzir uns vídeos e o diretor que me acompanha nas viagens é o Marcelo Martins, ex-baterista da banda Abysintho (aquela do Ursinho Blau Blau, do Sylvinho...)
A culpa é dele de eu me ausentar tanto nos comentários...mas, agradeço sempre por ter você por perto.


beijo grande,
Bruno

Nathália E. disse...

Impaciência... Isto tem me consumido.

Anônimo disse...

clap! clap! clap!

tem conto novo no Van dos Quebrados!! Passa lá!

bjs!

Taynar disse...

Sento-me e bebo contigo, goles longos e sofridos, porque de impaciência, meu corpo nunca está cheio.

Estou te linkando, moça, beijos

Anônimo disse...

Chutar o pau da barraca... pura e simplesmente. E com as palavras mais distintas que eu já vi. Perfeito.

meus instantes e momentos disse...

voltando ao teu blog, saudades daqui. Belo post, muito bom.
maurizio

SAM disse...

Flavia,

obrigada pela visita. Belíssimo blog e muito mais que a estética do blog ( belíssimo, arrojado, clean), é o seu brilhantismo e sensibilidade. Pessoas sensíveis são multitalentosas, ou será que esta multiplicidade de talentos é que lapidam a sensibilidade da pessoa? Quanto ao texto todos nós temos a nossa dose de impaciência. Mas se dela se faz um brinde é sinal de positividade, pois sorve-se o cálice, e lava-se o copo ou derrama-se quem sabe... É transistório, a medida que não se faça um hábito. A nossa paciência também tem limites, e até onde vai, por vezes desconhecemos...


Ótimo fim de semana! Beijos


Gostei muito, e aqui estarei sempre.

Germano Viana Xavier disse...

e eu que estou a beber uma certa e sádica impaciência diária com o tempo que acorda já brigando comigo e azucrinando ouvidos de morte minha.

veio dizer-me alguma coisa de fuga.

um carinho, Flávia.

Jay disse...

Olá, vim te pedir uma ajudinha...
Seguinte estou fazendo uma pesquisa pra tentar terminar um projeto, e gostaria que você por favor respondesse umas perguntinha que tem num blog que criei só por isso.
E se puder divulga aí pra todo mundo que você puder ok?
Brigadão desde já e o blog é
www.meajudaadescobrir.blogspot.com

Anônimo disse...

Flavinha, querida, achei esse teu texto brilhante, porém pesado. Muito bem escrito, mas sem aquela leveza que costumo encontrar por aqui. Ainda assim você arrasou (: Beijos

Mai disse...

Olá Flavinha, mais um dos belos...
Ah! amiga, desce mais duas doses para mim também.
Duplas, sem gelo, alternadas com um puro Buchanans...
Uff!
Queria estar, mas não ser, nem existir-me impaciente... mas hoje eu precisei. Precisei mesmo.
Não sei se somente hoje. Mas, especialmente hoje me embriaguei desta bebida amarga. Não engolí... E engolí a ácida... O ácido...
E Ahb! "SINTO". Sinto muito....
Que maravilha, Fláh.
Te gosto como se gosta dos bons e velhos amigos.
Carinho

Natália Nunes disse...

quando eu começei nesse negócio de poesia, e nem tem tanto tempo assim, eu escrevi uma coisa mais ou menos:

eu quero a calma que saiba se retirar, porque as vezes o que preciso é da calamidade.


beijo, flavinha :)

Anônimo disse...

Vamos nos embreagar de impaciência e controverter nossos corações e pensamentos até o estado putrito do ser, para uma hora, feito fenix, renascer da indigência moral para então nos achar! ... Filosófico não?! rsrs. Bjus e bfs.

http://so-pensando.blogspot.com

Flávia disse...

BRUNO,

Cazzonatti, vc vive! Imagina, compreendo sim. Tempo é algo que anda escasso pra todo mundo... mas vc, querido, comentando ou não, é sempre bem vindo aqui. Sabê-lo presente é o mais importante. E estou sempre por perto, sim - porque adoro o que vc escreve, e pq tb gosto muito de vc. Beijos muitos :)

NATHÁLIA,

Já eu tenho sido consumida pelo excesso de PACIÊNCIA. Beijo!

RAGAS,

Indo. Beijo!

TAYNAR,

Goles longos e sofridos, sim, bonita. E obrigada pelo link, fico lisonjeada :)
Beijo!

MI,

Chutar o pau da barraca ou ligar aquele conhecido e decantado botãozinho, rs... beijão!

MAURIZIO,

que bom que voltou, moço... apareça mais vezes, é um prazer, viu? Beijão!

SAM,

Seu comentário foi exato na intenção do texto. Os excessos sempre são prejudiciais, sejam de paciência ou de impaciência - uma dose desta, por mais ácida que pareça, é o equilíbrio... uma delicia sua visita, volte sempre vou adorar receber vc. Beijos!

XAVIER,

É a fuga da resignação mórbida, querido. Beijos :)

JÉSSICA,

Já votei, flor. Beijos :)

ANNA,

Aqui a gente "vareia", rs. Beijos!

MAI,

O carinho, querida, é recíproco:)
Beijos!

Flávia disse...

NAT,

Naaaaaat... é EXATAMENTE isso... preciso de um pouco de calamidade. Beijo:)

DAN,

filosófico,mas perfeitamente adequado, rs. Beijo!

Nadezhda disse...

Já disse isso uma vez, mas vou dizer novamente. Você escreve muito bem!

(E gostei de ver kafka por aqui. É meu autor favorito).

;)

Unknown disse...

o teor alcoolico do absinto pode ser fatal. Acho esta uma bela palavra e uma sedutora e poderosa bebida como esta escrito seu texto.

Sem gelo eh bem melhor! rs

Bjs.

O Profeta disse...

Frágil e palpitante luz
A beleza é feita de ternos murmúrios
A voz quebra a quietude do silêncio
A chuva leva a terra ao encontro dos rios

Não há fracassos no sonho
Caminhei nas nuvens para te ver do alto
Abri os braços ao relâmpago
Desci à terra, senti nos pés o frio basalto


Vem descobrir qual o caminho


Bom fim de semana


Mágico beijo

Anônimo disse...

Às vezes só mesmo com a impaciência pra nos mover e resolver o que nos acorrenta a alma.
Beijos e bom final de semana, querida!

Anônimo disse...

Um duplo, pra mim.
TIM-TIM!!!

Impaciência, bendita, da vez.

Ei, amiga-metade linda:
Belíssimo texto! Adorei o dialogismo travado, ótimo! :D

[tô no trabalho, um pepino atrás do outro! MAS, os meus meninos estão aqui, vasculhando o teu espaço, te descobrindo... como te disse.]

Beijo e amor.

Lica Veríssimo disse...

Flavinha,obrigada pelo comentário sobre a solidariedade ,no ziguezague.
Mas que maravilha encontro aqui.
Textos lindos e um espaço de muito bom gosto.
beijo

Paula Estrela disse...

Flavinha,

Que linda visita e que coment�rio mais fofo no meu espa�o :D. Amei demais! Volte sempre!

Ah, paci�ncia � como o mar, vai e volta no exerc�cio de viver.

Bjos!

Flávia disse...

NADEZHDA,

Obrigada, lindinha! Ando meio apegada com Kafka ultimamente, talvez andem aparecendo mais paráfrases dele por aqui... beijos!

ULTRAVIOLET,

Algumas diluições são mais fatais que beber puro e amargo, não? Beijos!

O PROFETA,

Belo poema, moço, obrigada por compartilhá-lo aqui. Beijo!

PATI,

O dialogismo é a ponto de partida de uma idéia que está fervilhando cá na minha cabecinha... e que delícia teus meninos por aqui! Diga-lhes que mando um beijo, que voltem sempre e que cuidem bem de vc, rs... beijos + amor :)

LICA,

moça, aquele post realmente me fez pensar... e fico feliz que tenha seguido o rastro do comentário e aparecido por aqui, bem- vinda e muito obrigada! Beijos!

PAULA,

claro que volto! Com prazer... minha paciência anda vagante por alguma profundeza desse mar aí - mas quem sabe ela não resolve retornar pra mim antes do que eu imagino? Obrigada pela visita, seja bem-vinda! Beijo!

Zé Luiz Sykacz disse...

HIC!!

Coincidência ou não, eu tenho tomado um porre de impaciência diarimante nas últimas semanas.

Não demora muito e eu tenho uma cirrose hepática moral. É bom tomar cuidado... hehehe

Estava com saudades, moçoila. Ando mais ocupado do que gostaria, mas não me esqueço de seus textos.

Hoje, finalmente, pude tomar a minha dose de Flavinha Brito. Um brinde! hehehe

Beijos moça!

Tudo ou nada ... disse...

Muito show o novo visual e o texto, parabéns
Bjos

raai. disse...

posso me juntar no brinde?

eu quero impaciencia, mas desse jeitinho que você descreveu :D
;*
muito bom o texto e o lay é lindo *-*

;**

Mila Cardozo disse...

Ah maninha... não consigo te imaginar cruel... sem esta tua sensibilidade... esta tua meiguice tão sua... Esta tal dose de impaciência... não combina com este teu sorriso tão seu....
Te adoro de montão... e espero que esta tua meiguice estaja sempre presente... pra eu ainda achar que este mundo tem jeinto....
Kisses Mila

Anônimo disse...

Como sempre uma reflexão muito interessante né Flavinha!! Você tem uma capacidade ímpar de enxergar as complexidades humanas sabia?? Este conflito de sensações que sempre nos atormentam estão sempre te dando asas para colocar diante de nós obras como esta, tão significativas e interessantes! Parabéns!

Flávia disse...

ZÉ,

Cirrose hepática moral... a gente morre disso? ;)
Já te disse que adoro quando vc me chama de moçoila? Beijos!

LUCIANO,

O visual não é tão novo assim, né? Mas obrigada, rs. Beijo!

MILA,

Irmã... acho que nem que eu NASCESSE DE NOVO... como me disseram há uns dias: não dá pra mudar a essência. E quando a gente tenta, ao invés de se proteger, se maltrata ainda mais. Então melhor deixar as coisas como são, né? Mas não se preocupe muito com isso não - o texto foi só um exercício literário ligeiramente tepeêmico pra diversificar um pouco as coisas por aqui. Amo vc. Beijos!

RAAI,

Opa, bem-vinda! Não vou ser indiscreta e perguntar por que vc quer tanta impaciência, tá? Muito obrigada pela visita, pelo comentário e pelos elogios, e vc está convidada a aparecer sempre - com brinde ou sem brinde, com impaciência ou sem impaciência. Beijos!

VINÍCIUS,

Muito obrigada, querido - mas um dia, ah... um dia vc me estraga, rs. Beijos!

Marcos Seiter disse...

Bah, lembro-me muito bem quando tomei essa bebida. **risos**

Ser ingerida acompanhada deste "descontexto" deve ser melhor ainda.

Beijos querida!!!


Marcos Seiter